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"Há Vagas" - conto extra nº 2

ATENÇÃO: SÓ LEIA SE JÁ TIVER TERMINADO DE LER O LIVRO "HÁ VAGAS"

primeiro semestre 2021 ~ São Paulo

Bianca

 

Timo: Bi, cadê você, amor? A gente quer dar boa-noite.

Nick: Não, não. Eu preciso te ver, Bia. É sério. Quero vídeo, liga a câmera

 

Suspiro profundamente.1 Exausta. Segurando o choro, como parece ser meu padrão de vida há meses. Nunca fui de reclamar da vida, né? Mas agora tá tão difícil não reclamar... Parece também que o mundo inteiro ganhou uma espécie de voucher para reclamar da vida o quanto quiser sem soar exagerado.

Todas as pessoas estão infelizes e cansadas. Nunca pensei que fosse ver o mundo unificado em torno de um sentimento — menos ainda que fosse este. Esse medo misturado à exaustão. Algum psicólogo já deve ter cunhado um termo para isso. Ou talvez eles também estejam cansados demais para isso.

Digito rapidamente:

 

Bianca: Tô chegando em casa. A gente já se fala.

Timo: Vc saiu, amor? Pra quê?

Timo: Tá de carro, né? Não pega Uber, não, Bi.

Bianca: Tô de carro, sim, vim na farmácia.

Timo: Não dava para pedir delivery disso, Bianca?

Nick: Alteza, Bianca é adulta. Deixa ela em paz.

 

Dou uma risadinha no amplo estacionamento da farmácia.

 

Nick: Mas não esquece de higienizar o aparelho quando chegar em casa.

Timo: Sabe que já tem cientistas dizendo que isso não faz diferença?

Bianca: Ótimo, uma coisa a menos pra surtar.

Timo: Mas não custa dar uma limpadinha, né, amor?

Nick: Decida-se, HRH. Ou confia na ciência ou não confia.

Timo: Até parece que tem algum consenso sobre essa merda desse vírus que dure mais de um mês, Nick.

 

Sacudo a cabeça, rindo, e meto o telefone no bolso antes de entrar no carro. E passar álcool nas mãos. E respirar fundo. E me olhar no retrovisor para ajustar a máscara. E ligar o carro para enfrentar mais trânsito do que eu deveria. Desde o ano passado é sempre mais trânsito do que deveria. Essas pessoas todas deveriam estar dentro de casa.

Mas eu vivo no Brasil. E aqui a história é outra. É cada um por si. O senso de coletividade passou longe e preservar a vida não é exatamente prioridade para este governo.

A gente achava que seria ruim. Ninguém poderia imaginar que seria tão ruim. Eu lembro quando nosso principal medo em relação a esse governo era a homofobia. Algo que afeta nosso casamento, é claro. Nosso primeiro ano foi sempre aturando uns olhares de vizinhos que cada vez mais percebiam que aquelas três pessoas morando juntas tinham comportamentos altamente suspeitos. Nick nunca fez questão de esconder nem esforço para disfarçar. Eu e Timo somos mais ressabiados: brasileiro nasce escaldado, né? Além do mais, éramos nós que ficaríamos lá depois que o Nick se fosse e teríamos que lidar com quaisquer comentários que Nick provavelmente nem entenderia.

— Me recuso a aprender português, não sou o Jesse. Vocês já falam inglês e só vocês me interessam.

— Isso te livra de ouvir muita merda dos vizinhos, é verdade — disse o Timo, arqueando as sobrancelhas.

 

— Aposto que eu é que passo por corna entre os vizinhos — eu comentei, brincando com a taça de vinho.

 

Estávamos sentados no chão da sala do apartamento da Piauí, bebendo vinho. Os dois caíram na risada.

 

Como eu sinto saudade do apartamento da Piauí. Quando vou buscar correspondência eu subo um pouco só para chorar na nossa cama.

 

— Não, não, sou eu que sou o corno, tenho certeza — rebatia Timo, rindo.

 

— Deixa de ser bobo, Timo, você é muito viado, é claro que eles olham para nós dois e sabem que eu tô te comendo.

 

— Viu? Eu é que sou a corna! — repeti.

 

Eu lembro tão bem dessa noite. Lembro do Nick me beijando no meio dessa conversa, mordendo minha orelha, lembro que eu estava morrendo de sono, que o Timo foi preparar alguma coisa pra gente comer na cozinha e, quando voltou, eu e Nick estávamos transando no chão da sala. Lembro de tudo.

 

Sinto falta do apartamento da Piauí. Mas sinto ainda mais falta deles.

 

Isso foi quando Nick veio para passar conosco o Ano Novo de 2019 para 2020. Tínhamos passado o Natal em Arbusto, eu, Timo e Gui. Depois voltamos para São Paulo e o Gui foi passar uns dias com minha mãe e minha avó na casa do meu irmão, para brincar com os primos. Durante todo o ano de 2019, meu filho ficou indo e vindo entre o apartamento da minha avó e o nosso apartamento na Piauí e foi ótimo. Funcionou muito bem. Descobri que minha mãe e minha avó sentiriam muita falta dele se ele simplesmente se mudasse de uma vez.

Naquele fim de ano, Nick chegou para ficar com a gente por um tempo. É tão estranho. Eu não lembro de nenhuma notícia sobre o vírus em dezembro. É claro que teve, sei disso. Acho que até lembro de eles comentarem. Mas eu não lembro de ver nada, juro. Passamos o mês de janeiro de 2020 juntos e foi simplesmente maravilhoso. Então Nick voltou para Londres e, de repente, aquele pesadelo caiu nas nossas cabeças de um jeito que não deixava dúvidas: era uma catástrofe mundial e ia engolir todos nós.

Na primeira onda de Covid no Reino Unido, a mãe do Nick pegou. Ele ruiu. Não tem outro jeito de dizer. Nunca vi o Nick naquele estado. Quando ela foi entubada, ele desmoronou. E Timo e eu tomamos, juntos, a decisão mais difícil da nossa vida de casal: nos separamos. Nick não podia ficar sozinho. Eu não queria isso, Timo não queria isso. Mas eu não podia ir. Ia levar meu filho? Não era como se fosse a coisa mais simples do mundo ficar pegando um avião para cruzar um oceano em plena pandemia — e ainda não é, especialmente se você está no Brasil, um dos piores lugares para se estar neste momento. Naquele momento específico, porém, a Inglaterra era um pouco pior.

Então Timo foi, e eu fiquei.

 

Ele ainda está lá. E eu ainda estou aqui.

 

Semana que vem faz um ano.

 

Um ano, meu Deus, um ano! Um ano que não vejo o Timo, e mais de um ano que não vejo o Nick!

 

O soluço atravessa meu peito como um raio, num susto. Aperto as chaves do carro nas mãos, comprimindo-as contra meu peito.

Calma. Calma.

Não é que eu me arrependa da nossa decisão. Nick precisava da gente, ou ao menos de um nós. Mal tinha recuperado a mãe, depois de décadas de afastamento, e agora a perdia dessa maneira tão brutal e solitária, sem nem poder se despedir direito dela. Foi horrível. Pelo menos ele não estava sozinho.

 

Não me arrependo. Mas eu não consigo acreditar que já seja um ano. Eu não aguento mais. Cada novo dia eu não aguento mais. É como se minha alegria, minha energia, tivesse sido sugada de mim. Sem gravações para o canal, sem ensaios, sem teatro, sem acompanhar o Timo no showzinho do bar, que ele faz tão lindo. Sem brigar com o Nick por causa de repertório do álbum. Eu não tenho mais a música. Nem o Timo. Nem o Nick.

 

Ainda no ano passado minha mãe pegou Covid. É claro que, trabalhando como secretária de uma infectologista, mamãe nunca se isolou. Quando ela adoeceu, eu trouxe a vovó (que não havia se infectado) para a Piauí. Passei a ficar indo e vindo entre os dois endereços, levando comida, ajudando com a limpeza. Foi exaustivo. Felizmente mamãe não teve um caso muito grave. No fim das contas, acabamos decidindo que, apesar dos riscos, era mais prático que nos isolássemos juntas, umas cuidando das outras, e todas cuidando do Gui. Mas voltar para o apartamento da vovó foi tão, tão estranho. Eu não queria mais morar ali. Sentia falta do Timo, do Nick, da nossa vida.

Foi numa noite de choro compulsivo que contei tudo para minha mãe e minha avó. Que estávamos os três juntos, que éramos um casal de três. Contei porque o clima estava horrível. Mamãe não falava muito sobre o assunto mas achava que o Timo tinha me deixado, me traído. Disse que entendeu o que expliquei, mas acho que nunca acreditou que isso seja possível. Ela ainda acha que estou sendo burra, que eles estão me enganando. E dói muito, com toda a saudade e solidão que estou sentindo, ficar me esforçando para convencê-la de que estamos juntos e os dois me amam. Eu já desisti. Deixa ela pensar o que quiser.

Eu odeio sair de casa. Tenho medo e fico tensa. Mas também odeio voltar. Queria que mamãe tivesse aceitado que nos isolássemos no apartamento da Piauí, que é maior e tem garagem. Mas ela diz que não vai morar de favor no apartamento de alguém que ela mal conhece (é o Timo!! Ela o conhece, sim!). Disse que ficaria sozinha sem problemas, que eu poderia ficar lá com a vovó.

Mas é isso. Eu não tive coragem de deixá-la sozinha.

A esta altura ela deve estar com horror ao apartamento, porque moramos os três juntos lá. Mesmo assim, não tenho coragem de deixá-la sozinha.

A solicitação de chamada de vídeo toca assim que tiro o pé do elevador para o hall do andar. Eu podia não atender, mas sei que já está tarde lá e meio que não estou me importando se mamãe me vir falando no telefone com meus maridos. O que ela pensa sobre nós já não está no meu controle há muito tempo. Eu não tenho mais energia para ficar abdicando do pouco que tenho deles.

— Oi — respondo na penumbra do corredor, enfiando a chave na fechadura. — Tô entrando em casa.

— Não tá na Piauí hoje? — pergunta Timo.

 

Torço a boca. Mas ele não pode ver, porque estou de máscara.

 

— Não. Tô na casa da vovó — digo, abrindo a porta.

 

Vovó acena para mim da cozinha. Eu aceno de volta mostrando que estou numa chamada no celular.

 

— Vá tomar seu banho, minha filha — ela diz, sorrindo. — Guilherme já fez o dever de casa, estou fazendo o jantar dele. Sua mãe ainda não chegou da clínica.

 

Minha avó é um anjo. Eu nem sei o que ela pensa sobre casais de três. Eu só sei que ela ama que o Guilherme e eu estejamos aqui e não tem nenhuma dificuldade em acreditar que eu tenho dois homens que me amam, porque ela acha isso super possível e muito justo, inclusive. Minha maior — e talvez única — alegria recente é vovó já ter se vacinado. Mamãe também, por trabalhar em hospital, já conseguiu se vacinar.

 

— Eu ouvi "banho"? — Timo pergunta, com um sorriso.

Sorrio sob a máscara e entro no banheiro com ele. Com o telefone, né?

— Você vai me fazer companhia? — pergunto, escorando o telefone nos meus vidros de perfume e começando a lavar as mãos.

 

— Ela vai tomar banho? — ouço Nick perguntar, se aproximando.

 

— Nessa hora você entende português, né? — Timo provoca.

 

Lavo o rosto sorrindo, só por estar ouvindo os dois, e começo a tirar a roupa.

 

— Ah, sim... Isso vai ser bom — Nick fala, já aparecendo no vídeo.

 

— Não vou ficar pelada no vídeo, não é hora para isso.

 

— Aqui é — Nick rebate.

 

— Aqui não, e meu filho tá acordado.

 

— Eu tô com tanta saudade de você. — Timo suspira.

 

De calcinha e sutiã, sento na tampa do vaso e pego o telefone na mão.

— Eu também — sussurro. — Tô tão cansada. Preciso tanto de vocês.

Na hora em que o desabafo começa a sair e a vontade de chorar queima a pele do meu rosto, me envergonho de desabar tão rapidamente diante deles. Parece que é só o que consigo fazer ultimamente com eles e até isso eu já não aguento mais. Tenho pena. Quero nossas outras partes, nossas outras coisas, nossos risos, nossos beijos, nossas noites juntos, nosso sono, nosso sexo.

Mas é isso a intimidade. É com eles que eu choro.

 

— Deixa eu falar com ela, Timo — pede Nick.

 

Timo torce a boca, contrariado.

 

— Você não vai mesmo me deixar ficar?

— Me dá um minuto com ela, por favor. Só um pouco.

Eu pisco e seco os olhos e pisco de novo, olhando para a tela do celular. Timo assente e sorri para mim antes de se afastar. Lá atrás, eu o vejo sair do quarto e fechar a porta sem fazer barulho.

Nick respira fundo e senta no chão, escorando as costas na cama.

 

Que não é a nossa cama porque eu nunca estive naquela casa.

 

— O que está acontecendo? — pergunto, nervosa.

E ele sorri.

— Eu amo você — sussurra, sério. — Eu falo pouco isso, não é?

Fecho os olhos devagar, ainda sentindo as lágrimas querendo sair.

— Fala menos do que eu gostaria.

— Eu amo você, Bia. E quero você aqui.

Abro os olhos para ele, ansiosa.

— Como? Como eu posso ir? As restrições…

— Eu sei que você vai entender mal o que eu vou dizer agora — ele me interrompe. — Que você vai entender como uma decisão de emergência, como um improviso, algo impensado. Eu preciso que você acredite que eu quero, do fundo do meu coração, dizer isso que vou dizer agora e que é uma honra para mim estar numa posição em que eu possa fazer essa proposta para você.

Eu estou congelada, olhando a tela. Nunca vi o Nick falar assim comigo.

— É, eu tô falando bem sério porque quero que você preste atenção.

 

— Estou prestando atenção — balbucio.

— Quero que você se case comigo.

 

— O quê??

 

— Pega um avião com seu filho e vem para Londres. Você vai chegar aqui e vai casar comigo, entendeu? No papel, tudo direitinho. Eu e Timo vamos fazer o que for preciso aqui no consulado, você só tem que dizer "sim" e vir.

 

— Mas… E nós? Nós três?

 

Ele sorri, balançando a cabeça.

 

— Meu amor, nós três sempre seremos nós três. Mas mesmo que eu possa casar com o Timo no papel, eu infelizmente não posso casar com vocês dois. Bigamia ainda é crime.

 

— Então por que eu?

 

— Não é óbvio? Porque o Timo já está aqui, Bia! Porque ele tem família aqui para dar endereço às autoridades e você ainda está aí, nessa merda desse país, com todo o respeito, amor, mas esse governo é perigoso, Bianca.

 

Quem sou eu para discordar...

 

— Ninguém aguenta mais isso, Bia, nem eu, nem o Timo, nem você. E tem o Guilherme, se você quer saber, isso pesa muito na minha decisão, sim.

 

— Nick, por favor, né? Você não tem que se responsabilizar pelo Guilherme.

 

— É óbvio que tenho, que porra de casamento é esse? — Ele está se exaltando. — Bianca, eu estou sendo sensato e prático e você sabe disso — ele muda o tom.

 

— É isso que me assusta!

 

Ele dá uma risada.

 

— Não quero que você seja meu empresário pra ficar tomando esse tipo de decisão racional por mim!

 

— Eu já sou, né, Bianca?

 

— Mas não na minha vida pessoal!

 

— Exatamente — ele diz de maneira ainda mais incisiva, trazendo o telefone mais para perto do rosto. — Na sua vida pessoal, eu sou o quê?

 

Droga. Já passamos por isso.

 

— Sou seu marido, não sou?

 

Eu busco ar, me sentindo nervosa.

 

— Já tivemos essa conversa, Bia. Sou seu marido ou não sou? Algo mudou?

 

— Não! Não, claro que não, meu Deus… — Encosto a cabeça para trás, na parede fria. — Eu só quero…

 

— O que você quer? Me fala — ele pede com toda a suavidade.

 

Eu tento não rir e chorar ao mesmo tempo, mas é o que acontece.

 

— Nick, você tá me matando hoje, o que deu em você?

 

Ele ergue um ombro, daquele jeito, e torce a boca num sorrisinho charmoso.

 

— O que deu em mim? Estou tentando convencer você a assinar um papel com meu nome, minha linda. E eu sempre fico insistente e insuportável quando preciso que você assine um contrato para mim, não é?

 

— E sempre consegue.

— Mas sempre incluo qualquer cláusula que você exija, meu amor, então me diga. O que você quer?

 

Respiro devagar, olhando para ele. Eu sei o que eu quero.

 

— Quero nós três juntos. Quero voltar a cantar com o Timo. Dormir com você.

 

— Amo essa divisão de tarefas, isso é ótimo.

 

— Quero meu filho junto comigo. Quero todos nós na mesma casa. Nós quatro.

 

Enquanto eu falo, sinto que as lágrimas voltam a escorrer pelo meu rosto.

 

— A casa está aqui. Eu tô aqui. O Timo está aqui. Só falta você e o Gui. Vem, Bia.

Olho para o teto, fungando, tentando pensar e respirar. Isso não significa apenas casar, isso significa me mudar para Londres. Levando meu filho. Sei que este é um momento caótico para decidir isso e o que me deixa mais nervosa é que parece que por isso mesmo é o momento certo. Ainda é uma decisão enorme. Ainda é um passo imenso. Vai tirar tudo do lugar.

Mas tudo já está fora do lugar, há um ano. Dizer que nunca pensei em morar em Londres com eles? Claro que pensei. Olha o inferno que o Brasil virou, é claro que eu penso em sair daqui.

Mas isso ainda significa deixar minha mãe e minha avó para trás.

 

— Bianca?

A voz dele chama a minha atenção novamente e eu olho para a tela. Quase morro de susto.

— Ai, meu Deus, Nick... — sussurro, surpresa, cobrindo a boca com a outra mão, quando vejo que ele tem na mão uma caixinha aberta com uma aliança dentro.

 

— Quer casar comigo?

 

— Você realmente… Você… realmente… — Eu começo a rir. — Se preparou para isto?

 

— É claro que sim! Venho pensando nisso há semanas, Bia. Não tem nenhum dia de manhã que eu não acorde com a certeza de que essa é a nossa solução.

Respiro fundo.

 

— Nick...

 

— Eu mandei fazer três iguais. — Ele tira a aliança da caixinha. É fina, de ouro, com um brilhante bem pequenino incrustado. — Essa aqui é a sua, mas você tem que vir buscar.

— Ai meu Deus... O que o Timo acha?

— Acha que eu já devia ter te pedido em casamento semana passada, é isso que ele acha!

Só quando eu rio é que percebo como estava preocupada com isso. Sempre sinto como se eles dois tivessem precedência porque a história deles veio antes da minha com o Timo.

E o Nick sempre age como se fosse o contrário, como se ele tivesse atrapalhado eu e o Timo.

E o Timo sempre diz que nós dois estamos errados, mesmo que ele não saiba dizer o que é o certo.

Nick chama o Timo e eu ainda estou rindo quando a porta se abre de novo lá atrás e Timo entra no quarto.

— Você me deve vinte libras — diz, quando Timo entra no quarto.

— Ela não aceitou?? — Timo para no meio do quarto, chocado.

— Calma, ela vai aceitar. — Nick sorri para ele.

 

— O que foi que você apostou? — pergunto, intrigada.

 

— Que você ia aceitar, mas só na frente dele. — Nick aponta para o Timo.

 

— Ah... — Olho para o Timo. — E você apostou o quê?

 

— Que você diria "sim" na hora. — Ele sorri. — Não me julgue. É o Nick, Bianca. Não dá pra dizer "não" quando ele pede a gente em casamento, acredite, eu sei.

 

— Você hesitou, Alteza. Hesitou um bocado — Nick resmunga.

— Gato, ela tinha me dado um pé na bunda na véspera, eu não tava legal.

Eu amo quando o Timo chama o Nick de "gato". Eu tenho um tesão nisso que não consigo nem explicar.

— É, eu admito que ela sabe deixar a gente em situações bem desesperadoras, tô aqui quase rastejando. Por uma mulher. Nada contra, Alteza, mas ela bem que podia…

— Sim.

Os dois se calam e viram para mim.

— Sim. Eu quero casar com você, Nick. Com vocês. Com qualquer um de vocês. — Eu começo a rir. E chorar. — Droga, não, eu quero casar com os dois. Mas eu entendi. Eu entendi o plano e eu topo. Eu vou casar com você, Nick.

Timo aperta o ombro do Nick, que exala, aliviado.

— Eu sabia. — Ele balança a cabeça, com um daqueles sorrisos charmosos. — Sabia que ia ser só você entrar aqui e ela ia dizer "sim".

 

— Isso é tudo teatro — diz Timo, esfregando a mão na nuca de Nick. — Ele tava super nervoso com essa proposta, Bi.

 

— Você me levam à loucura. É sério. Isso é tóxico. É a segunda vez na vida que eu tenho que fazer uma proposta de casamento e continuo solteiro!

 

Timo o encara, franzindo as sobrancelhas.

 

— Ai, Timo! — Nick bate na mão dele, cujo aperto na nuca se tornou forte demais.

 

— Solteiro porra nenhuma, seu safado! — Ele dá um tapa no braço de Nick, que está rindo.

 

— É culpa minha, por acaso? Casem comigo de uma vez, pelo amor de Deus!

 

Assistindo os dois brigando e implicando um com o outro, eu não sei se choro ou se dou risada. Minhas mãos estão tremendo. Eu não sabia qual resolução eu queria para essa separação, a não ser desejar inutilmente que a pandemia desaparecesse como se nunca tivesse acontecido e atrapalhado nosso destino. Como sempre, para nós, as possibilidades são muitas, o que acaba complicando qualquer decisão. Mas desde que a gente fique juntos, sei que vamos ficar bem.

*

1Take Me To Church, Hozier.

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